Esses programas se mostram bons chamarizes de jovens das classes A e B – e, portanto, de anunciantes ávidos por atingir esse segmento. Segundo a Controle da Concorrência, empresa que monitora a propaganda na TV, o Pânico contabilizou 37 ações de merchandising em suas cinco últimas edições e o CQC, 55. Há tempos a Record sonhava em ter Mion, ex-estrela da MTV, como apresentador de um programa moderninho nessa linha. O apetite de Mion levou-o além: ele assumiu a criação e a direção geral do projeto. Deu pitacos até no figurino, enfatizando tons de laranja, cor que por alguma razão esotérica ele associa à paz e à criatividade. Embalado pela fartura de dinheiro dos bispos, atacou em duas frentes. Da MTV, tirou o ex-punk João Gordo e a trupe Hermes e Renato. Assediou, ainda, as produções do Pânico e do CQC. Provocou a baixa de três profissionais desse último. Suas investidas, oferecendo o dobro dos rendimentos, irritaram o CQC. “Até hoje ele liga para o pessoal com convites para mudar de lado”, diz um profissional da atração. O próprio Mion ostenta um belo salário, na faixa dos 75 000 reais – que podem chegar a 200 000 com a participação em publicidade.

Os CQCs enxergam semelhanças entre seus quadros e os da atração da Record. Reclama o humorista Rafinha Bastos: “Por que imitar o que está aí? A TV já é tão repetitiva”. Em edições recentes, Legendários e CQC apresentaram entrevistas com Ronaldo Fenômeno e esquetes que tratavam de pedofilia. No programa da Record, o quadro Whatever, em que a humorista Miá Mello faz as vezes de uma entrevistadora desmiolada, lembra o Repórter Inexperiente, que deu fama ao CQC Danilo Gentili. Mion alega que sua inspiração foi o humorista americano Andy Kaufman (1949-1984). “Com certeza, o Gentili bebeu da mesma fonte“, diz.
Se o clima entre os humorísticos não estava para piada, o modo pomposo como Mion fala do Legendários fez as relações azedar de vez. O apresentador já declarou que a atração iria “virar lenda”. “Qualquer frase é motivo para atirar pedras em mim. Mas trazer João Gordo para a TV aberta é algo que vai mesmo ficar para a história”, diz. Mion proclama ainda que faz humor “do bem”, o que deu margem a ironias. No Twitter, Gentili passou a se classificar como uma pessoa de “mal humor” (o erro de português é proposital). Mion critica a prática dos rivais de abordar celebridades à queima-roupa. “Prefiro fazer coisas mais elaboradas. Só trabalho com roteiros bem estudados”, informa. Então, tá.
Não é preciso crer na autoproclamada bondade de Mion para perceber que o “mal humor” de Gentili no Twitter volta e meia escorrega na grosseria. Quando Hebe Camargo retomou seu programa no SBT, em meio ao tratamento de um câncer, ele postou um comentário impublicável. No Twitter e na TV, Rafinha também mostra a mesma deficiência de faculdades autocríticas. Em um novo programa da Band, A Liga, ele faz o gênero “repórter participativo”. Já botou barba postiça para se passar por mendigo – um show de populismo. Esse é o pior sintoma da institucionalização do deboche: a autocomplacência.
*Notícia publicada na revista Veja, edição de número 2165. Texto de Marcelo Marthe.
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